7 de setembro – de Trento a Roncegno Terme

9° dia de pedal (Trento a Roncegno Terme): 49,5 km

Ainda bem que estávamos com as perninhas bem descansadas depois de três dias só de descidas e retas, pois logo na saída de Trento gigantescas subidas nos aguardavam. 

Subidas enormes logo na saída de Trento. Esta passa ao lado do Castello del Buonconsiglio,
residência dos príncipes trentinos do século XIII ao século XVIII. 

Nas encostas inclinadas, além das macieiras agora aparecem também vinhedos. 

Mas as subidas nem foram nosso maior desafio neste dia: o pior mesmo foi conseguir achar o caminho. A "pista ciclabile" do vale do Alto Adige e sua excelente sinalização infelizmente terminam em Trento. Daí para a frente, ao que parece, a organização fica a cargo da Associazone Via Claudia Augusta Italia – e é aí que os problemas começam.
Não é coincidência, aliás, que em Trento também acabe o fluxo de cicloturistas. De lá até Veneza, encontraríamos pouquíssimos corajosos de alforjes como nós.
Na saída da cidade, as placas tornam-se mais escassas e, para piorar, como não há ciclovias, a sinalização manda para a autoestrada e você fica desconfiado se o caminho é aquele mesmo, porque até agora o percurso tem sido feito quase exclusivamente por ciclovias ou estradinhas rurais. Em um desses momentos nos quais a sinalização da Via Claudia mandava para a autoestrada, um senhor cheio de boas intenções nos parou e disse que não deveríamos ir por ali, pois era muito perigoso para ciclistas; em vez disso, deveríamos pegar a "pista ciclabile".
O problema é que esse senhor – assim como outras pessoas a quem pedimos informações ao longo do caminho – não conhece a Via Claudia. Eles veem a pessoa de bicicleta e logo acham que ela quer percorrer a ciclovia do Valsugana, que contorna o Lago di Caldonazzo. Esse é realmente um caminho muito agradável para ciclistas... mas passa a uns 10 km da Via Claudia! E foi mais ou menos essa a distância que tivemos de voltar quando percebemos que estávamos em outra ciclorrota. Antes de encarar essa volta, porém, tiramos um cochilo à beira do lago.

O Lago de Caldonazzo, por onde passa a pista ciclabile de Valsugana.
Cuidado para não confundi-la com a Via Claudia, como nós fizemos!

No caminho de volta para a Via Claudia, encontramos lindas paisagens.

Contraste de cores.

Em todo o norte da Itália, havia essas fontes de água potável
onde podíamos reabastecer as garrafinhas. Maravilha!

Depois de reencontrar a Via Claudia e vencer mais algumas subidas, chegamos à bela Roncegno Terme debaixo de uma refrescante chuva de verão. Acho que a cicloviagem é a modalidade de turismo em que você mais tem contato com os elementos da natureza – e mais aprende a apreciá-los! Uma chuva como esta, por exemplo, é muito bem-vinda após um dia de pedal puxado sob o sol.

Chegando à pequena Roncegno Terme.

Roseira na entrada do Agritur Montibeller.


Seguindo mais uma dica preciosa do nosso amigo carioca, ficamos em uma pousada rural chamada Agritur Montibeller. Comum nessa região, o "agritur" é uma fazenda ou sítio que recebe turistas. O ambiente é simples, claro, mas muito aconchegante.
Jantamos muito bem na própria pousada e depois ficamos horas papeando com o dono do lugar, que tem parentes no Espírito Santo.

Fachada do Agritur Montibeller, uma propriedade rural que recebe turistas.

Ambiente simples e muito aconchegante.

Como nos tempos da Bíblia: pão, vinho, água e azeite!



Hospedagem em Roncegno Terme: Agritur Montibeller (56 euros p/ o casal – com café da manhã) - prós: ambiente simples, mas limpo e acolhedor; quarto grande, equipado com todos os utensílios (inclusive pia e minifogão); garagem coberta para as bikes; jantar excelente, muito barato, farto e saboroso; contra: nenhum.

6 de setembro - Bolzano a Trento

8° dia de pedal (Bolzano a Trento): 65 km

Uma característica do trecho italiano da Via Claudia é que agora há várias lanchonetes voltadas para ciclistas ao longo do caminho, coisa que não ocorria na Alemanha e na Áustria. Esses estabelecimentos recebem não apenas cicloturistas (que nessa região já são mais raros), mas  principalmente speedeiros, que aproveitam os quilômetros e quilômetros de ciclovias asfaltadas. No primeiro dia em solo italiano (de Pfunds a Coldrano) ainda houve alguns trechos off-road, mas tanto ontem como hoje o percurso foi 100% no asfalto.
Aproveitamos um desses pontos de parada para fazer um lanche admirando as Dolomitas. Essa imponente cadeia de montanhas foi, aliás, o grande destaque da paisagem no dia de hoje.

Pausa para o lanche admirando as Dolomitas.

Esta maravilhosa cadeia de montanhas faz parte dos Alpes.
Algumas das mais magníficas paisagens da Via Claudia Augusta
podem ser vistas neste trecho entre Bolzano e Trento.

Simplesmente sem comentários, né?

Observem também que demos adeus aos agasalhos. Agora jaquetas, segundas peles e balaclavas vão ficar guardadinhas no fundo do alforje até voltarmos ao Brasil!
Para a hospedagem, seguimos a maravilhosa sugestão de um amigo carioca que já fez a Via Claudia e ficamos no Hotel Vela, a 2 km do centro de Trento. Foi o melhor custo-benefício até agora: por uma diária relativamente econômica, tivemos um ótimo quarto, com café da manhã, garagem coberta, restaurante no próprio hotel para o jantar – e, acima de tudo, um atendimento simplesmente fenomenal. Além de toda a equipe ser atenciosa e gentil, o gerente nos ofereceu um laptop reservado para uso dos hóspedes e assim, finalmente... tchan tchan tchan... conseguimos baixar os vídeos da GoPro! Ufa! Agora, sim, a memória está livre para novos vídeos!

Hotel em Trento: Hotel Vela (72 euros p/ o casal – com café da manhã) – prós: atendimento excelente, bom quarto, bom restaurante, garagem coberta para as bikes, bom sinal de internet em todo o hotel; contra: todas as áreas comuns do hotel são muito quentes; no quarto ainda dá para usar o ar-condicionado, mas no resto do hotel não tem jeito: prepare a regata porque você vai passar calor.

5 de setembro - Coldrano a Bolzano

7° dia de pedal (Coldrano a Bolzano): 64 km

Uma coisa que estou querendo comentar há alguns dias é a impressionante quantidade de cicloturistas que temos visto na Via Claudia desde o início da viagem. Muitos deles são senhores e senhoras com mais de 60 anos. Aliás, a vitalidade dos idosos europeus é outra coisa admirável. Volta e meia somos ultrapassados por vovôs e vovós todos lampeiros em suas speeds ou nas tradicionais ciclocross de aro 28. Outros preferem caminhar e passam de lá para cá com seus specks.
Também encontramos famílias inteiras pedalando na Via Claudia Augusta, além de mulheres puxando reboques com bebês ou cachorros. O clima entre os cicloturistas é de camaradagem e somos sempre cumprimentados por quem vem na direção contrária.
Desde que cruzamos a fronteira da Itália, as placas da Via Claudia praticamente desapareceram, mas foram substituídas pela excelente sinalização da "pista ciclabile della Valle del'Adige". Observem que o alemão ainda aparece nas placas. Aliás, apesar de estarmos na Itália, na região do Alto Adige se fala um dialeto germânico, o dialeto sul-tirolês.

Nesta região não há placas da Via Claudia, mas há a
perfeita sinalização da "Pista Ciclabile della Valle dell'Adige".

O alemão ainda está presente nas placas. Na verdade, por aqui não
se fala italiano, e sim o dialeto sul-tirolês.

No percurso de hoje não houve descidas tão pronunciadas, exceto por um morro que descemos de uma vez só. O restante dos 60 e poucos quilômetros foram percorridos em um terreno praticamente plano, com uma leve inclinação descendente.

Coldrano foi a última cidade friazinha por que passamos. Na nossa descida rumo ao sul, o sol
estaria sempre presente... e a temperatura aumentaria cada vez mais!

Vista da última descida íngreme que pegamos.

Parada para o lanche à beira do rio Adige.

Saímos de Colandro de jaqueta, pois estava frozinho, mas chegamos lá embaixo, em Bolzano, morrendo de calor. Quase na entrada da cidade, outro raio da bike do Eduardo quebrou. Agora não tinha jeito: tínhamos que consertar aquela roda.
Chegamos à cidade umas 16h e fomos direto ao centro de informações turísticas. Fiz três pedidos à atendente: que nos indicasse uma oficina de bicicletas, um internet café (até agora não conseguimos as benditas entradas USB para baixar os vídeos, e a memória da GoPro está praticamente lotada!), além de um hotel próximo à oficina. Supergentil, ela tentou em vários hotéis, mas ou estavam lotados ou ficavam longe. Quanto ao preço dos hotéis, fiquei impressionada, pois eram bem superiores aos que temos pagado – basta dizer que o albergue da cidade cobrava nada menos que 45 euros por pessoa!
Bem, depois de algumas tentativas, ela nos conseguiu lugar em um hotelzinho tão caro quanto os outros, porém bem próximo, então pudemos deixar as coisas lá e ir até a bicicletaria. Era, na verdade, uma gigantesca loja de esportes, a Sportler, onde fomos bem atendidos e os raios foram trocados em menos de uma hora.
Achamos o internet café, mas mais uma vez não foi possível baixar os vídeos: de acordo com o simpático atendente, que conversou conosco um tempão, a legislação italiana antiterrorismo e antipedofilia impede o acesso a periféricos como HD externos ou filmadoras sem identificação do usuário, por isso os computadores dos cybercafés travam automaticamente o acesso a esses dispositivos. E lá fomos nós de volta para o hotel com a memória da GoPro ainda lotada!
Uma coisa que chama a atenção logo de cara em Bolzano, a primeira cidade grande que atravessamos na Itália, é que não há nem sombra daquela organização toda de ciclovias que vimos na Alemanha. Pedestres, ciclistas, automóveis – todos andam ao mesmo tempo por todos os lugares! Mas as bicicletas continuam onipresentes, como vemos por este grande estacionamento de magrelas na segunda foto abaixo. Também nos chamou a atenção uma prática máquina de venda automática de câmaras (terceira foto), instalada ao lado da loja Sportler para o ciclista resolver seu problema de pneu furado a qualquer hora do dia ou da noite.

Bolzano: uma cidade fervilhando de turistas.

Grande estacionamento de bicicletas.

Furou o pneu à noite? Sem problemas! Nesta máquina de venda automática,
você coloca algumas moedas e compra uma câmara na hora que quiser!

Hotel em Bolzano: Hotel Adria (88 euros p/ o casal – sem café da manhã) - prós: boa localização, ao lado do centro histórico e em cima de uma padaria; contras: caríssimo pelo pouco que oferece; não tem nem sequer internet gratuita – é preciso pagar 10 euros a mais por 4 horas de uso.

4 de setembro - Pfunds a Coldrano

6° dia de pedal (Pfunds a Coldrano): 73 km

De acordo com o nosso plano inicial, traçado com base nos roteiros feitos por amigos que vieram anteriormente à Via Claudia, a noite do dia 4 deveria ser passada em Nauders, uma estação de esqui que fica imediatamente após a grande subida que leva ao Reschenpass. Contudo, como estávamos a apenas 15 km de Nauders, decidimos fazer a subida e depois continuar até a próxima parada, Silandro, já que após o Lago Resia é só descida.
E foi isso que fizemos! Começamos o pedal às 9 da manhã – comparativamente cedo em relação aos outros dias, pois só temos começado às 10h ou 10h30.

O Reschenpass – o ponto mais alto da Via Claudia – nos aguardava neste dia!

Seguindo as placas, fomos por uma ciclovia que corre ao lado da autoestrada. Em certo momento, há um alerta para que os ciclistas não continuem pela estrada, pois não haverá mais ciclovia e ficará muito perigoso. Em vez disso, eles devem seguir pelo desvio que leva à localidade de Martina, na Suíça.
OK. Seguimos o alerta e despencamos trilha adentro até Martina – para depois subir tudo de novo, é claro. Agora podemos dizer que conhecemos a Suíça... apenas alguns quilômetros, mas já conhecemos!

Os poucos quilômetros da Via Claudia na Suíça passam por uma linda trilha no vilarejo de Martina.

O termo "Terra Raetica" designava a região dos Alpes sob domínio dos romanos.  

A subida do Reschenpass pela trilha de Martina foi, como imaginávamos, bem dura. Enquanto a do Fernpass conseguimos fazer inteira pedalando, nesta tivemos que empurrar um longo trecho.

Aqui não teve jeito: tivemos de empurrar boa parte da subida.


Depois de muita subida, aconteceu um fato bem estranho: a trilha nos levou de volta àquela perigosa estrada onde bicicletas não podem circular. Até agora não entendemos o que aconteceu. A trilha acabava e havia um aviso da organização da Via Claudia dizendo que não deveríamos prosseguir pela autoestrada – mas também não havia nenhuma indicação sobre por onde continuar. Procuramos em volta... e nada. A trilha simplesmente acabava ali e só havia a autoestrada. Para piorar a situação, algum engraçadinho tinha arrancado uma das placas, que talvez trouxesse alguma indicação útil.
Sem outra saída, tivemos de seguir pela autoestrada. Aí o bicho pegou. Foi, sem dúvida, o momento de maior tensão em toda a viagem, o único em que tivemos de enfrentar o trânsito pesado de uma estrada estreita, sem acostamento. E tudo isso subindo, pois ainda estávamos longe de alcançar o topo da montanha. Nos túneis, tínhamos de descer da bike e empurrar. E claro que ouvimos algumas – merecidas – buzinadas.
Durante a subida, observamos um trecho em obras na frente do museu de Nauders. Será que a trilha passava por lá, mas teve de ser interrompida por causa das obras? Não sei, só sei que o estresse só terminou quando chegamos a Nauders e reencontramos a ciclovia.
De Nauders a Resia, onde fica o marco do Reschenpass (ponto mais alto da Via Claudia) e a fronteira da Áustria com a Itália, ainda temos uma ligeira subida.

O Castelo Naudersberg, que fica entre Nauders e Resia.

Chegamos lá: o ponto mais alto da Via Claudia!!!

Fronteira da Áustria com a Itália.

Também na cidade de Resia fica o lindo lago de mesmo nome, com a famosa torre submersa.
Linda paisagem à beira do Lago di Resia (ou Reschensee em alemão).

O lago foi artificialmente criado em 1950, pela junção de dois lagos naturais.

Uma das construções inundadas pelo lago foi esta igreja do século XIV,
cuja torre permaneceu como um último testemunho do vilarejo que aí existia.

O que acontece depois do Lago Resia é algo que só posso descrever como a melhor experiência que qualquer pessoa que goste de bicicleta pode ter: são simplesmente 45 km de descida. Mas não é uma descida qualquer: é uma descida por um cenário de conto de fadas, com infinitos campos de macieiras de um lado e do outro o rio Adige, ora mais estreito, ora mais imponente, mas sempre muito veloz, cheio de corredeiras.
O perfume das maçãs embala a descida e a cada poucos quilômetros chegamos a uma aldeiazinha italiana diferente, cada qual com suas vielas, seus edifícios históricos, suas casinhas floridas.

Uma indescritível descida de 45 km espera pelo cicloturista após o Lago di Resia.

Gigantescas plantações de maçãs ladeiam toda a descida.

No caminho, graciosas cidadezinhas do norte da Itália.

Nem tirei tantas fotos, pois sabia que elas jamais poderiam traduzir a experiência única dessa descida, que encanta os cinco sentidos. Acho que os vídeos feitos pelo Eduardo poderão dar uma ideia melhor.
Nosso plano era parar em Silandro, mas acabamos ficando em uma cidadezinha próxima, Coldrano. Achamos um hotel que oferecia café da manhã e também jantar para aquela noite. Apesar de ser um pouco mais caro do que os hotéis onde temos parado, achamos que esse "pacote completo" nos pouparia o tempo e o "saco" de ir atrás de restaurante. Além disso, o quarto era enorme, então pudemos lavar bastante roupa e espalhar para secar em tudo quanto é canto!

Hotel em Coldrano: Bamboo Hotel (150 euros p/ o casal – com jantar e café da manhã) – prós: hotel maravilhoso, quarto enorme com varanda, fantástico buffet tanto no jantar como no café da manhã, internet no quarto; contra: o preço, claro – até agora ele foi a maior extravagância da nossa viagem!


3 de setembro - Imst a Pfunds

5° dia de pedal (Imst a Pfunds): 55 km

Começamos a jornada felizes por ter conseguido lavar as bikes no hotel de Imst. Depois de toda a lama que pegamos na travessia do Fernpass, elas estavam mesmo precisando de uma boa ducha. Para completar a nossa alegria, a chuva tinha parado e o sol começava a sair, apesar de a temperatura ainda estar bem baixa.
Toda essa alegria, porém, duraria pouco. Havíamos rodado menos de 10 km quando tivemos o primeiro problema mecânico da viagem: um dos raios da roda traseira do Eduardo quebrou. Até aí, nada demais. A questão é que ele está usando o sistema tubeless (sem câmara) e, pelo jeito, houve algum problema com a fita que faz o isolamento entre o interior do pneu e os raios, pois teoricamente não deveria haver comunicação entre eles; no entanto, houve, sim, muuuita comunicação entre eles: na verdade, no momento em que o raio quebrou, todo o líquido selante do interior do pneu começou a vazar pelo furo do niple.

Primeiro problema mecânico da viagem: um raio quebrado fez com que todo o líquido selante do sistema tubeless vazasse.

Depois de tentar sem sucesso estancar o vazamento, resolvemos tirar o selante que tinha sobrado no pneu e colocar uma câmara normal. Isso seria uma tarefa relativamente simples em uma roda de aros normais, mas os superestreitos aros tubeless dificultam as coisas um bocado. Espátulas normais não aguentam; ainda bem que tínhamos comprado em Munique uma espátula de plástico reforçado da Topeak.
Quando o Eduardo finalmente conseguiu retirar o pneu e começou a colocar a câmara nova (nova mesmo, tirada da caixa), surpresa: ela estava com dois rasgos! Rasgos com alguns milímetros cada, não simples furos. Usamos o remendo rápido e tentamos, novamente com grande esforço, colocar a câmara outra vez. Quando o Eduardo começa a enchê-la, ouvimos mais uma vez o ar escapando: além daqueles dois rasgos, havia também um furinho (apesar de a câmara, como dito, ser nova em folha)! E dá-lhe retirar pneu, remendar câmara e recolocar tudo de novo... Vale lembrar que, como o Eduardo estava usando o sistema tubeless, tínhamos apenas uma câmara reserva do pneu dele – e ainda assim por pura precaução, já que o tubeless, teoricamente, não deveria dar esse tipo de problema.
Toda essa movimentação se desenrolava sob os olhares dos moradores do vilarejo austríaco onde paramos, que acompanhavam aquela estranha cena com interesse, fazendo perguntas e nos ajudando como podiam. Mas nós demoramos tanto com essa troca de pneus que eles acabaram desistindo da gente e foram para casa almoçar.
Com a câmara nova remendada duas vezes e o pneu aparentemente cheio, deixamos o vilarejo. Mas mal pegamos a estradinha rural e o pneu esvaziou novamente: aquele primeiro remendo rápido, colocado sobre os rasgos, não estava aguentando a pressão. O Eduardo teve de tirar o pneu e a câmara novamente e colocar um pedaço de silver tape sobre o remendo original. E foi assim que essa incrível fita, que já resolveu problemas até em naves espaciais, permitiu que finalmente prosseguíssemos viagem.
Apesar das três horas perdidas com esse incidente, conseguimos cumprir a meta do dia: rodar 55 km, já em leve ascensão, e chegar à cidadezinha de Pfunds, que fica antes do início da grande escalada que leva ao Reschenpass, o ponto mais alto da Via Claudia.

Depois de perder três horas com o problema no pneu, retomamos o lindo caminho até Pfunds.

Com o frio intenso, infelizmente não deu para mergulhar nesta cachoeirinha...

Águas transparentes reluzindo ao sol!

Pfunds é uma cidadezinha de apenas 2.500 habitantes, muito tranquila e com pousadas relativamente baratas. Escolhemos a primeira que encontramos, a Pension Gabl, bem em frente à igreja.

A igrejinha no centro de Pfunds.

Quando saímos para jantar, vivemos uma experiência inusitada: pegamos uma rua errada e fomos parar em uma parte da cidade oposta à dos restaurantes. O engraçado é que caminhamos uns 20 minutos e não encontramos uma alma viva para nos dar uma informação. E olha que não eram nem oito e meia da noite!
Quem nos salvou foram duas mocinhas maquiadas em estilo gótico – o que combinava perfeitamente com o clima de cidade fantasma de Pfunds!

Hotel em Pfunds: Pension Gabl (71 euros p/ o casal – com café da manhã) – prós: bom quarto, bom café da manhã, garagem coberta para as bikes; contra: a internet não funciona nos quartos, só no salão de jogos.

2 de setembro – Füssen a Imst

4º dia de pedal: Füssen a Imst (63,6 km)

Logo na frente da nossa pousada em Füssen havia uma placa com os dizeres: Republik Österreich - 700 m. Como somos ignorantes, não sabíamos que Österreich é o nome da Áustria em alemão austríaco, então ficamos nos perguntando o que queria dizer aquela placa e passamos todo o dia de hoje procurando uma placa da Áustria para poder fotografar... É mole???
Não sabíamos que o nome da Áustria em alemão é Österreich, por
isso não entendemos esta placa. Santa ignorância, Batman!

É claro que logo depois (700 m) de sair da pousada já estávamos em terreno austríaco. Nos dois dias vividos nesse país vimos muitas paisagens que pareciam saídas de um comercial da Nestlé ou dos chocolates Milka: vaquinhas pastando placidamente, casas de balcões floridos, regatos, pequenas cachoeiras – e, é claro, as gigantescas montanhas dos Alpes ao fundo.
Cena típica do Tirol austríaco: vaquinhas pastando com os Alpes ao fundo.
Lindas casas, sempre floridas.

Outra característica da arquitetura são estas pinturas ao redor das janelas.

E foram essas gigantescas montanhas que finalmente tivemos de encarar... A jornada de hoje foi a mais puxada até agora, com subidas realmente íngremes. Afinal, hoje foi o dia de cruzar a primeira "passagem de montanha" da rota, o Fernpass, a quase 1.300 m de altitude.
Boa parte do caminho hoje foi em trilhas de mountain bike, não nas tradicionais ciclovias asfaltadas. Felizmente, meus pneus 32mm têm tido um desempenho excelente e enfrentado todo tipo de terreno sem qualquer problema.

Hoje o percurso foi bem off-road.
Trilhas maravilhosas!
Está vendo aquela montanha ao fundo? É para lá que a gente está indo!

Ao longo da subida, cachoeiras e ruínas históricas. Como vocês podem perceber pelas fotos, estava um frio de rachar. Por baixo da roupa normal de ciclismo, hoje usamos segunda pele na parte de cima e também para as pernas.

Construções históricas na subida da montanha.


Estão vendo aquela estradinha beeem lá embaixo? Pois é. É de lá que nós saímos para escalar o Fernpass.

 Não é à toa que, quando termina a subida, a placa no topo diz em três línguas: "Graças a Deus!".

Após vencer o Fernpass, descemos – literalmente – até Imst. Não tínhamos reservado hotel, mas demos sorte: o primeiro onde perguntamos tinha vaga e, apesar de ser um hotel mais caro do que os que temos ficado, o gerente nos fez uma oferta especial para um quarto que, segundo ele, era bem menor que os demais.
Jantamos uma das melhores refeições de toda a jornada no restaurante La Taverna VI: massa com escalopinhos e um maravilhoso molho gorgonzola.

Hotel em Imst: Eggerbrau (80 euros p/ o casal – com café da manhã – preço especial para um quarto pequeno); prós: hotel 3 estrelas, bem cuidado e com bom café da manhã; atendimento gentil; lugar coberto para guardar as bikes; contras: não sei qual é o preço normal, mas deve ser mais de 100 para o casal.