11° dia de pedal (Feltre a
Treviso): 85 km
E aí você está no penúltimo dia da Via Claudia e pensa: o pior já passou, os Alpes já ficaram bem para trás, agora é só moleza. Se houver algum morrinho, vai ser algo pontual, como a encosta do Monte Grappa
ontem.
Se você pensar assim – como nós pensamos –, guarde bem este nome:
Praderadego. É lá que a criança chora e a
mãe não escuta.
Basta dizer que hoje foi, de longe, o dia mais difícil de toda a jornada. Chegamos a Treviso às oito horas da noite, dez horas depois de ter saído de Feltre, com quase 90 km rodados,
exaustos, sem uma gota de água nos
Camelbacks e – principalmente – sem disposição para rodar nem mais um
quilômetro. Mas vamos começar o relato desse duríssimo dia desde o início.
Saindo de Feltre, só para
variar perdemos a Via Claudia e fomos parar em um morro com fortes subidas
(mas, pelo que observamos depois na altimetria oficial, no caminho normal também teríamos de cruzar uma montanha). Na
cidadezinha de Cesiomaggiore, reencontramos a Via e seguimos sua sinalização,
que estava excepcionalmente boa nesse trecho. Passamos por várias aldeiazinhas montanhesas, com construções
não tão seculares quanto as do Alto Adige, mas também peculiares e charmosas.
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Cidadezinhas do Vêneto. |
Seguimos nesse passo até uma cidade chamada Villa de Villa. Logo que saímos de lá, percebemos que algo de
muito estranho estava para acontecer: demos de cara com uma descida alucinante,
incrivelmente íngreme e sinuosa, com curvas
tão fechadas que pareciam de montanha-russa. Essa descida nos levou direto ao
fundo mais fundo do vale – de onde, é claro, tivemos de subir tudo de novo.
Como se vê na placa, Praderago nem está tão alto assim: são apenas 910 metros acima do nível do mar. O problema é que antes de iniciar a subida se desce muito, até o fundo do vale, então a ascensão é quase total. Depois de toda subida monstruosa
como essa vem, é claro, uma monstruosa
descida. Embora ela fosse um alívio, não
pudemos relaxar ainda, porque a inclinação era forte demais e as curvas muito
fechadas. Toda hora precisávamos dar uma paradinha para descansar a mão e aliviar o freio – que esquentava pra burro
e começava a fazer mais barulho que um freio de ônibus.
Enquanto descíamos, admirávamos a imponente montanha que havíamos escalado. Agora era possível vê-la por
completo – e também aqueles pontinhos lááá embaixo, de onde tínhamos saído horas antes.
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Horas antes nós estávamos lááá embaixo. |
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Na descida dá para apreciar melhor a grandiosidade da montanha. |
Se você observar no mapa o roteiro
"normal" de Feltre até Treviso, para ser feito por um carro, são apenas 50 km. A Via Claudia, porém, segue um verdadeiro labirinto pelos
vilarejos, dando voltas e mais voltas para escapar das autoestradas. Assim, se
você seguir à risca o roteiro oficial, em vez dos 50 km, rodará aproximadamente
100 km.
Até aí tudo bem, porque ninguém quer mesmo pedalar nas autoestradas
europeias (que em geral nem acostamento têm) e a ideia de uma cicloviagem pela
Via Claudia é justamente percorrer aldeias e cidades pequenas por tranquilas
ciclovias. O problema é que depois de Follina (o ponto final da descida) a sinalização da Via Claudia
torna-se péssima. Em alguns pontos,
ela mais atrapalha do que ajuda, porque você começa a seguir as placas e de repente elas desaparecem, te deixando no
meio do nada. Programado para chegar a Treviso, nosso GPS indicava o caminho
mais curto e direto, pela autoestrada, então os momentos de divergência em relação à rota da Via Claudia – e de dúvida sobre qual caminho escolher – eram constantes.
Quando já eram mais de 17h e já tínhamos rodado mais de 60 km, vimos uma placa da Via Claudia indicando que Treviso
ainda estava a 36 km. Pelo GPS, pegando diretamente a autoestrada rodaríamos 22
km até Treviso. Mortos de cansaço, resolvemos mandar a Via Cláudia às favas e
seguir o GPS, mesmo que fosse pela autoestrada!
Foi um pouco tenso pedalar na pista, mas nada diferente do que já
enfrentamos do Brasil. Quando estávamos quase chegando em Treviso, voltamos a
avistar a sinalização da Via Claudia. Decidimos segui-la, mas mais uma vez nos
ferramos, pois as placas sumiram de repente e, para não nos perdermos ainda
mais, tivemos de voltar ao caminho do GPS.
Mais tarde, revendo o mapa do site oficial (
www.viaclaudia.org), descobrimos por que as placas sumiram de repente: na verdade, a Via Claudia termina
antes de Treviso, em uma localidade chamada Altino. Daí para a frente, quem quiser continua até Mestre (Veneza), como nós fizemos, mas já não está mais na Via Claudia.
Bem, depois da gigantesca subida do Praderadego e de todas as confusões com os caminhos, chegamos a Treviso de noite. Ficamos em um hotelzinho bem fuleiro na
entrada da cidade – até porque não tínhamos ânimo para continuar rodando até
encontrar outro.
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Chegamos a Treviso oito horas da noite. Conselho de amigo: divida esta etapa da
Via Claudia em dois dias, em vez de fazer em um dia só como nós fizemos. |
Conselho de amigo: se quiser seguir a Via Claudia de Feltre a Treviso,
divida a jornada em dois dias! Fazer em um só é para deixar qualquer ciclista doido...
Hospedagem em Treviso: Hotel Tre Santi (50 euros p/ o casal – com
café da manhã) – prós: fica antes do centro da cidade, então, se você chegar morto como nós chegamos, não precisa rodar até lá; contra: todos... hehe... Acho que foi o pior hotel onde ficamos durante toda a viagem. O quarto era sujo e fedorento, as bikes ficavam ao relento e o café da manhã era indescritivelmente ruim.